(9-10-1934)
O que há em mim é sobretudo cansaço -
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço asssim mesmo, êle mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amôres intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas tôdas -
Essas eo que falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Êste cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum dêles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para êles a vida vivida ou sonhada,
Para êles o sonho sonhado ou vivido,
Para êles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...
Este poema de Fernando Pessoa, escrito em 9 de outubro de 1934, é uma reflexão profunda sobre o estado de cansaço existencial e a busca por significado na vida. O poema expressa uma sensação de exaustão que não se origina de uma causa específica, mas sim de uma saturação geral com as complexidades e futilidades da existência.
O poema começa enfatizando o "cansaço", e esse cansaço não é atribuído a algo em particular, mas é uma sensação difusa e persistente. Pessoa descreve uma série de experiências e emoções humanas, como "a subtileza das sensações inúteis", "as paixões violentas por coisa nenhuma" e "os amôres intensos por o suposto em alguém", e sugere que todas essas coisas contribuem para esse cansaço.
O poema também explora a ideia de idealismo, descrevendo três tipos de idealistas: aqueles que amam o infinito, aqueles que desejam o impossível e aqueles que não desejam nada. No entanto, o eu lírico se posiciona de forma diferente. Ele ama "infinitamente o finito", deseja "impossivelmente o possível" e quer "tudo, ou um pouco mais, se puder ser". Essa atitude parece ser a fonte de seu cansaço supremo, pois ele busca intensamente a plenitude da experiência e da existência.
No final, o poema sugere que essa busca incessante pelo máximo na vida resulta em um "supremíssimo cansaço". É como se a ânsia por tudo, o desejo pelo máximo, o levasse a um estado de exaustão profunda, mas ainda assim ele abraça esse cansaço com uma espécie de felicidade, aceitando-o como parte intrínseca de sua jornada.
No geral, esse poema de Fernando Pessoa é uma meditação sobre a natureza da existência humana, a busca por significado e a tensão entre a intensidade do desejo e a sensação de cansaço que pode surgir dessa busca constante. É uma reflexão profunda e complexa sobre a condição humana e as diferentes maneiras pelas quais as pessoas buscam dar sentido à vida.